sexta-feira, 1 de outubro de 2010

A incansável busca pela fuga à rotina.

Não é que eu tenha tantos afazeres e aventuras loucas a ponto de não ter mais tempo para sentar e escrever aqui. Na verdade, a Alemanha tem sido muito suave comigo no que tange a estar ocupada. Acordo todos os dias às sete da manhã, tomo um café enquanto leio uma revista, pego o ônibus e vou para a aula. Os horários do curso de alemão são meio malucos e chego a ter cinco horas seguidas de aula, entrecortadas por pequenas pausas de dez minutos para mais um café. Basicamente, as obrigações do meu dia acabam aí. Depois do almoço no Mensa com alguns amigos, volto para casa e já tenho tempo para o ócio, para a escrita, para deveres de casa e para cuidar do apartamento. E é exatamente por isso que não tenho escrito. Parece que já atingi o período do intercâmbio em que tudo se estabilizou e virou rotina e, quando penso em vir aqui contar algo a vocês, não consigo encontrar palavras que façam meus dias mais emocionantes do que realmente são. De qualquer maneira, a intenção do blog sempre foi registrar. Só porque os dias sejam chatos, não significa que os relatos também tenham que ser. Vamos ver se eu consigo essa proeza.

Já não me lembro muito bem da semana passada. Só consigo lembrar da maré de azar e da dor de cabeça que ela me causou. Para tentar me livrar da primeira o mais rápido possível, tratei logo de comprar um cartão de ônibus semanal e pagar a multa que devia. Para resolver a segunda, evitei os remédios e abri uma garrafa de vinho para relaxar. Digamos que acabei abrindo foi uma garrafa de melancolia e não quis sair durante grande parte do fim de semana. Chovia fininho, minha cama estava quente, eu tinha filmes e comida, além de alguns amigos online no Skype. Minha sexta-feira se resumiu a isso. Aproveitei a noite para soltar o riso devido a duas taças de vinho e algumas conversas virtuais, graças ao advento da webcam. E nem venham me condenar. Não é só porque eu estou em outro país que tenho que ser outra pessoa e arranjar algo de super interessante para ocupar cada segundo da minha estadia. É humanamente impossível. Eu concordo, porém, que não devia deixar essa preguiça social se alastrar e tomar todo o fim de semana.

Por isso acordei sábado com o humor um pouco melhor e convidei a Michelle para almoçar na cidade. É incrível como tudo fica diferente no centro nesse dia da semana. Os lojistas colocam as roupas em araras do lado de fora dos estabelecimentos, as pessoas levam os animais para passear e uma feirinha de fazendeiros é rapidamente instalada no St. Johanner Markt. E tudo isso enquanto chove fininho. É muito ânimo, não? Pois bem. Michelle e eu nos sentamos no Alex's, um restaurante charmoso e... repleto de pombos. O garçom precisa dividir sua atenção entre eles e os clientes. Um pombo chegou, inclusive, a voar contra a cabeça de uma moça que estava sentada perto da janela. Eu fiquei sem ar de tanto rir. Coitada. Bom, comi chicken masala, um prato indiano bem apimentado, e tomei um suco de laranja fresco cujo preço era absurdo. Depois de comermos, fomos ver o que significava a pequena aglomeração em frente ao teatro. Era uma feirinha internacional, com pequenos stands com comida típica da Turquia, da Grécia e de alguns países da África. Pena que tinha acabado de almoçar. De qualquer forma, ficamos por lá um pouquinho, porque algumas crianças fofas se preparavam para dançar no palco. Balé, dança moderna com o tema da Pantera Cor-de-rosa e a dança da galinha. A última foi um momento nostálgico, que me levou de volta ao segundo período, quando me vesti toda de galinha para isso. A isso seguiu-se a valsa, executada por dois casais de pré-adolescentes tímidos e preocupados demais com a coreografia para conseguirem sorrir. Depois da apresentação das crianças alemãs, veio uma turca. A menina estava vestida de adulta, com direito a batom vermelho e pintinha sexy no rosto. Ao final da dança, ela distribuiu rosas e eu ganhei uma especialmente bonita - quanto ao perfume nada posso dizer, porque estava gripada. Em seguida, um casal do Uzbequistão tocou música típica. Voz e acordeão. Lindo. Por fim, um grupo de senhoras italianas dançou a tarantella e fechou a tarde com um humor super vibrante. Aproveitando-me da energia recém-adquirida, fui ao supermercado para ter o que comer em casa durante a semana seguinte. À noite fomos para o apartamento do Luke ver Sexdrive e alguns vídeos bobos no youtube. Não quis sair, mais uma vez. Voltei para casa às dez e fui dormir.


Domingo acordei tarde, tomei um café da manhã preguiçoso e demorado e já acabei pensando no que ia fazer pro almoço. Sim, só comer e dormir. Esse foi o meu domingo. E, à noite, mais uma taça de vinho. Mergulhei em um estado de literatice aguda, li Clarice Lispector e Borges, conversei sobre literatura com o Vavá e dormi um sono profundo e merecido.

No dia seguinte, acordei bem disposta, mantendo em mente a previsão do Caíque de que a maré de azar passaria. Fui à aula, participei e tive explicações esclarecedoras sobre a complicada voz passiva alemã. Voltei para casa com vontade de enfiar a cara dos livros e aprender tudo de uma vez. Lógico que falhei e tive mais um dia academicamente improdutivo.

Terça foi um dia estranho. Tive uma noite toda de pesadelos e acordei com um frio na barriga, que se devia à aula de comunicação oral. O professor havia dividido a turma em dois grupos para que pudesse analisar cuidadosamente a habilidade de fala de cada um. Não sou muito fã de ter a atenção voltada para mim enquanto, como aluna, discurso em outra língua. A tarefa? Improvisar em dois minutos de fala uma apresentação sobre o Brasil. Lá fui eu, em pé, à mercê de ouvidos prontos para criticar. Não fiquei satisfeita com meu desempenho, mas o professor elogiou e disse que eu sou articulada, sei lidar com o público e que minha entonação se aproxima à de um falante nativo. Foi um santo remédio para o ego. Voltei para casa toda tagarela e orgulhosa. O orgulho se elevou a um nível ainda mais inesperado quando recebi, por email, um convite de uma professora do colégio aqui perto. Eles estão organizando uma semana de projetos sobre a América Latina e eu fui convidada para falar sobre a infância no Brasil para os meninos da sétima série! Morrendo de medo de ser vaiada, aceitei. Vai ser um belo desafio. Claro que a minha euforia não durou muito. Assisti a Lost in Translation e fiquei novamente com o humor balançado. Mais tarde vieram muitas lágrimas inexplicáveis, que acabaram por tomar o lugar dos meus planos para a noite. Queria ir ao Heimbar provar a Desperados, uma cerveja com sabor de tequila muito popular por aqui. Acabei fazendo sopa de números (porque os alemães são das ciências exatas e não gostam de sopa de letrinhas) e me acabando em desabafos com a Tai. Discursei longamente sobre como eu pensava que não merecia estar aqui, porque não faço nada de útil o dia inteiro. Depois de aliviado o drama, o Ivan me pediu ajuda no dever de alemão e eu consegui explicar tudo direitinho. Tomada pelo sentimento de finalmente ter feito algo de útil, fui dormir.

Dia seguinte, dia de folga. Não tenho aula quarta-feira. Arrumei o apartamento e fiz arroz, acompanhado de batata gratinada na manteiga e na cebola com pimentões. Amarelo, verde e vermelho, para enfeitar o prato e colorir meu dia chuvoso. Subi na escrivaninha para limpar as janelas e vi a floresta de um ponto de vista diferente, além de encontrar uma joaninha pousada no teto. Aqui na Alemanha elas são sinal de sorte. À tarde a chuva deu uma trégua e fui passear. Bastam cinco minutos de caminhada até o Wildpark, uma espécie de zoológico no meio da floresta. Respirei ar puro, caminhei na mata, tomei um solzinho para tirar o mofo, vi javalis, bisões, cabras e alguns outros animais. O ambiente é super agradável e repleto de crianças loirinhas e rosadas. Ao final de uma das trilhas, existe um café. Fui sem dinheiro, então não pude saborear uma torta maravilhosa que estava na vitrine. Daqui a uns dias volto lá para isso.





Ontem à noite fiquei sem internet, não sei por que, e confirmei a hipótese de que é a internet a culpada por eu não conseguir estudar. Sem ela, escrevi um texto em alemão, estudei gramática e li os dois primeiros capítulos do livro que havia comprado em um sebo de manhã. Die unerträglich Leichtigkeit des Seins. A insustentável leveza do ser, um dos meus livros preferidos. Como já conheço a história, achei que seria um desafio legal lê-lo em alemão.

O dia hoje foi tranquilo e... bem, meu penúltimo dia de aula antes das férias. Sim, as aulas começaram há duas semanas e já vou ter FÉRIAS de quase 20 dias. E as aulas na universidade ainda não começaram, para quem ainda não sabe. Só dia 18 de Outubro, quando ainda estarei em Barcelona. É, parece que os próximos dias prometem ser melhores! Hoje vou ao Oktoberfest aqui de Saarbrücken, mesmo achando que é uma farsa, porque o Google não sabe nada a respeito. Depois de hoje, afinal, saberei mais que o Google. Incrível, não?

9 comentários:

  1. Ei Joh! Tenho passado sempre por aqui e, embora pra você as coisas possam parecer meio rotineiras demais às vezes, pra gente aqui é muito legal ver alguém conhecendo tanta gente de lugar diferente e se virando para ter uma vida legal sozinha. Lembro muito de quando te conheci, nas aulas de inglês do Cultura, e logo gostei de você. Não sei bem o porquê, mas fato é que sempre tive a certeza de que você era vazia. E, mesmo sem (quase) nenhum contato com você (agora tenho o blog, rs), a certeza permanece. Boa sorte, viu? Gabi

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  2. E conte-nos o máximo possível para que nós também saibamos mais que o Google. Proeza, han?! hasudiahdua te amo e ah! o passaporte tá agendado, menos um. ufa.

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  3. VAI JUSTIFICAR COMO SEU NÃO-VOTO JOH?
    "TÔ À TOA NA EUROPA SÓ ESTUDANDO QUANDO A INTERNET CAI (IGUAL NO BRASIL)"

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  4. Aaaahhhhh a insustentááável leveza do ser...... Estou refletindo......................... Eu li nas nos EUA tb, já que eu não tinha TV nem computador. Jó, acho que pra realmente entrar em uma cultura, vale a pena vivenciar sua rotina né? Nada como um dia após o outro.... =D

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  5. Incrível!!!! Adorei! :) Have fun! Barcelona é linda!

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  6. Boneca, adorei seu prato!!! Ficou lindo e combinou com o protetor da mesa. E oh, rotina é saudável e sabendo aproveitar traz muita paz. Te amo! Mamãe

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  7. soh faltou o pimentao laranja que tem ai pra colorir mais o prato....
    e nada de deixar o tempo chuvoso te abater e dar saudades de casa ao ponto de nao sair....
    aproveita ai, mesmo que seja pra ir sei lah, na lojinha da esquina....
    pq quanto mais em casa com chuva e tempo nublado, mais tristizinha ce fica....
    bora fazer coisinhas felizes nem que seja dar voltinha em livrarias pra ver livros...

    saudadeee

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  8. olá!!
    passei pra mandar um beijo e desejar muitas boas coisas!!
    vejo que todas as experiências que vc tá passando aí são muito ricas, inclusive a de criar uma rotina caseira, ter preguiça de sair, etc... tudo isso é aprendizado, e é vida também!!
    bjinhos, até mais!!!
    deborah

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  9. seu prato ficou lindo! deu vontade de comer!! e vc sabe como eu gosto de comer! hahaha

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