sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Enfim, a primeira semana de aula.

Ainda no Brasil, sentia muita ansiedade quando pensava em como seriam as aulas por aqui. Depois de muito pensar e esperar, de conhecer muita gente, ir a muitas festas, viajar bastante, sentir a invasão de "pools of sorrow and waves of joy" e finalmente me adaptar ao fato de estar sozinha - e morando sozinha - em um país estrangeiro (e bem estranho), as aulas enfim começaram. Tive quatro meses de férias e por isso teria o direito de demorar a entrar no ritmo. Ledo engano. Não só NÃO posso, porque as coisas aqui já estão a mil por hora, quanto não quero.

No primeiro dia de aula, acordei e estava tudo escuro. Um silêncio absoluto tomava conta do meu quarto e da floresta. Quando coloquei o nariz para fora da porta, logo pensei que minha roupa não seria suficiente. Ventava frio e, pouco a pouco, fui percebendo que tudo estava congelado. O chão molhado estava coberto de folhas ligeiramente esbranquiçadas e o ar estava perceptivelmente diferente quando comparado ao dos dias anteriores. Geou. Eu fiquei toda boba e emocionada, pensando em como será quando finalmente nevar. Enquanto esperava no ponto de ônibus, percebi que todos os carros estavam cobertos de gelo e pareciam freezers ambulantes. Foi um bom entretenimento durante alguns minutos, mas passado um tempo, já não aguentava mais esperar. SEIS ônibus passaram direto pelo ponto, porque estavam cheios. Para piorar, começaram uma obra entre a minha moradia e a universidade e o trânsito está cada dia mais intenso. Logo, cheguei à conclusão de que vou precisar acordar não mais às sete, mas às seis, para conseguir ser pontual e estar na sala de aula às oito.

Fatores climáticos relatados, volto-me ao tema inicial. Na aula de produção de texto me percebi completamente enferrujada e vi que as férias não haviam me feito bem, linguisticamente falando. O professor, inclusive, fez questão de ressaltar o quão bom meu português estava, a julgar pela estrutura do texto que escrevi em alemão. Saindo do curso de alemão, fui ao prédio onde seria minha aula de Literatura Irlandesa (é o semestre irlandês na universidade toda). Para começar, não conseguia encontrar a sala. Descobri, ao observar as pessoas ao redor, que ninguém sabia qual era, exatamente. Chegamos juntos a um consenso, entramos na sala e lá ficamos durante meia-hora, sem que o professor chegasse, até que alguém teve a brilhante ideia de ir até a sala onde a aula havia ocorrido na semana anterior, quando eu estava em Barcelona. O professor estava lá, na metade da aula, e não sabia que haviam nos trocado de sala porque aquela era pequena demais. Na verdade, ele só percebeu que o tamanho da sala não era suficiente quando nós, os atrasados, tivemos que nos sentar no chão. Isso prova que alemães não planejam as coisas de forma tão perfeita como dita o estereótipo.

A aula, em si, foi bem interessante. O professor é irlandês e foi convidado para participar desse tal semestre irlandês em Saarbrücken. O sotaque dele, assim como as expressões faciais, é incrivelmente engraçado e eu precisei me segurar muito para não rir em alguns momentos. A aula é ministrada em inglês e parece que não será tão fácil como eu imaginava. Vamos ler muitos textos dos principais autores irlandeses e fazer um paralelo com a história e a sociedade da Irlanda. O que eu notei de mais intrigante, porém, foi a turma. A quantidade de gente de sobretudo preto, cabelo pintado de preto, blusas de banda e sombra preta era enorme. E isso - exceto por alguns fatores - inclui o professor, cabeludo e em trajes escuros. Uma menina, inclusive, jogava Warcraft no meio da aula. Cheguei a desconfiar que estava em algum tipo de seita disfarçada de aula e me senti bem... colorida.

Terça-feira era a minha primeira aula em alemão, na Faculdade de Germanística. Gente, que frio na barriga. Tamanho era meu nervosismo, custei a achar o prédio e, dentro do prédio, a sala. E eu já tinha estado naquele prédio antes. E, quando encontrei a sala, não tinha certeza se era ali mesmo e fiquei com medo de que a qualquer momento eu me percebesse intrusa em uma aula de Biologia Molecular ou algo assim. Felizmente, porém, era mesmo a turma de Grundkurs: Sprachwissenschaft (o que equivale à Introdução aos Estudos Línguisticos no Brasil). O frio na barriga piorou na hora da chamada. Senti o coração palpitar forte e as mãos suarem. Ao chegar no meu nome, o professor parou, porque não conseguia pronunciar, e perguntou quem era. Levantei a mão timidamente e aí mesmo começou o interrogatório: por que tantos nomes? De onde você é? Por que você veio para a Alemanha? Você estuda o que no Brasil? Vai ficar até quando? Vai querer fazer a prova ao final do semestre? Por qual nome devo chamar a senhora (senhora!)? Eu, previsivelmente, fui ficando cada vez mais nervosa, sentia minhas bochechas queimando e fiquei com tanto calor que, no final do interrogatório, estava sem uma blusa de frio sequer. Enquanto isso, todo mundo olhava para mim como se eu fosse uma extraterrestre. Passada a chamada, a aula. Ai, que surpresa gostosa ver que já começamos pelas árvores sintáticas com as quais estou tão familiarizada! Era um dos meus assuntos preferidos no segundo período na UFMG. Isso foi, decerto, um alívio e eu respondi mentalmente as perguntas do professor e quase sempre estava certa. Mesmo que a estrutura da língua seja diferente, não foi tão difícil acompanhar.

O dia seguinte foi um pouco mais corrido. Acordei ainda mais cedo do que de costume, porque tinha hora marcada no Ausländerbehörde (Departamento de Estrangeiros) para prolongar meu visto. Para quem não sabe, brasileiros não precisam de visto para entrar na Alemanha a turismo, mas, se quiserem ficar aqui para estudar e trabalhar, precisam ir até esse departamento e fazer o requerimento. Era um pouco longe do centro e fui, acidentalmente, junto com o Sem e um marroquino gente boa cujo nome não me lembro. Pegamos um ônibus errado e ele quase perdeu a hora. Chegando lá, tudo bem tranquilo. Fui atendida pontualmente e, às onze e meia, estava de volta na universidade, onde fiquei até tarde. Consegui me sentar na bibiloteca por quase duas horas e fazer páginas a fio de exercícios sobre voz passiva, porque teria prova de gramática no dia seguinte. Depois do almoço, fui para a aula de Literatur des Sturm und Drang, mais uma vez morrendo de medo de ser o centro das atenções. Não deu outra. O professor me pulou na chamada e eu tive que falar. Ele, envergonhado, disse que tinha pulado por não saber pronunciar o nome e que procuraria ao final da aula saber quem era. Mais uma vez, precisei explicar a minha situação e todos ficaram me olhando com curiosidade. E o susto foi ainda maior quando ele recomeçou a fazer a chamada para que todos pudessem ESCOLHER como seriam avaliados ao final do semestre. Muito bem decididos, os germanistas falaram, um por um, se queriam trabalho de casa, prova, apresentação oral... E chegou a minha vez. Eu pedi para decidir depois, porque não fazia ideia do que era melhor para mim. Ao final da aula, o professor disse que para ele é suficiente que eu frequente as aulas e faça os deveres. Eu não vou ter nota se fizer isso, mas ele mesmo disse que a disciplina é pesada, até mesmo para os alemães. Vamos ver o que decido até o Natal. Vou ter que ler um romance do Goethe, Die Leiden des jungen Werther (Os sofrimentos do jovem Werther), duas peças do Schiller, Die Räuber (Os Bandoleiros) e Kabale und Liebe (Intriga e Amor), além de alguns poemas representativos para a época. Fora isso, os textos teóricos. Todos haviam lido o texto pedido para a aula e eu fiquei meio perdida. Os alunos participam de verdade e nunca existe espaço para o silêncio constrangedor de quem não sabe responder o que o professor quer saber. Por esse motivo, creio que as aulas sejam melhores que as nossas no Brasil.

Terminada a aula, voltei à biblioteca para tentar descobrir como fazia para tirar xerox dos textos. Aqui não tem uma gráfica supercompleta como na Letras da UFMG. E eu passei um pequeno aperto até que descobrisse isso. Os professores têm pastas, que ficam na entrada da biblioteca. Você vai até lá, pega a pasta, deixa sua carteirinha e ruma até a máquina de xerox, onde você tira SOZINHO as suas cópias, com um cartão previamente comprado. Eu não tinha o cartão nem a menor ideia de como funcionava uma máquina daquelas. Quando finalmente consegui adquirir o cartão, voltei à máquina e tentei. Tentei de novo. Depois de descobrir que tudo que eu precisava fazer era apertar um simples botão, errei algumas vezes e tirei aproximadas cinco cópias inúteis, com uma mancha preta enorme. Consegui, ao fim, cópias razoáveis, mas sem o primeiro centímetro da margem esquerda das páginas.

Ontem à tarde, depois de já ter feito a prova de gramática, tive a primeira aula de Pilates. Eu tinha me esquecido de que seria esporte em alemão. Chegando na sala, a mulherada tagarelava - em alemão - como em qualquer academia e a professora nos contou um pouco sobre a história e os princípios do Pilates. Engraçado foi quando todas estavam concentradas nos exercícios, de olhos fechados, e eu olhando para todo mundo para copiar as posições, já que não entendia muito bem o que a professora dizia. Até isso vai ser um desafio. Saindo do Pilates, encontrei a Lud e a Claudinéia no Mensa para irmos buscar a herança que o outro mineiro que morava aqui nos deixou. Voltei para casa com algumas vasilhas, um cobertorzinho e alguns temperos.

À noite fomos eu, Lud, Jackson e Ian para a universidade para assistirmos à sessão de cinema do centro de apoio aos estrangeiros daqui. Cidade de Deus, com áudio em português e legendas em alemão. Preciso confessar que ainda não havia assistido e que fiquei verdadeiramente chocada. Cheguei a sentir enjoo, quase chorei e fiquei envergonhada pelo Brasil. Voltei para casa meio abalada, mas tentando pensar no fim de semana que chegava.

Bom, fico por aqui. O post de hoje foi só para registrar a sensação até então desconhecida de ser caloura na universidade. Só me lembro de ter me sentido novata na escola, lá na 3ª série, quando estourei acidentalmente uma garrafa d'água em plena sala de aula no meu primeiro dia no Santa Marcelina e todos riram. Não sei como, na UFMG sempre soube como agir desde o princípio e não me lembro de ter passado por situações em que tenha ficado perdida como fiquei aqui. Não tem trote, mas sou oficialmente uma caloura da Universität des Saarlandes.

domingo, 24 de outubro de 2010

Barcelona.

Acabo de passar por uma tentativa falha de acordar cedo para me readaptar a horários, já que amanhã é oficialmente meu primeiro dia de aulas na universidade e eu queria estar com o sono em dia. As aulas começaram dia 18, mas eu estava a aproximados 1100km de distância da sala de aula, contradizendo meus objetivos de me concentrar nos estudos.

Preciso confessar que, a princípio, Barcelona nem estava nos meus planos. Antes de vir para a Europa, tinha as minhas destinações já traçadas. Aparentemente, em linhas frágeis e variáveis, e Barcelona se aproveitou disso para se impor no meio de tantas outras escolhas. O Thomas, que conheci em Brasília em 2006, de repente propôs que fôssemos conhecer terras catalãs e eu, não menos de repente, aceitei.

Dia I
Sábado, dia 16, acordei com dor de garganta e gripada, morrendo de medo de viajar sozinha e de perder algum dos muitos transportes que tinha que pegar. O trajeto foi este: um trem de Saarbrücken para Idar-Oberstein, um ônibus de lá para Frankfurt-Hahn, onde pegaria um avião para Girona, de onde pegaria um ônibus para Barcelona. Tudo de novo na volta. E, como se não bastasse, estava tensa com medo de que a Ryanair não aceitasse a minha bagagem, já que as medidas eram ligeiramente diferentes das exigidas e ela excedia em 800g o peso-limite. No final das contas, deu tudo certo e me deixaram embarcar. No avião, sentei-me ao lado de duas senhoras alemãs tagarelas e uma delas resolveu me ajudar a pegar o ônibus para Girona, sem mesmo que eu pedisse. Ela assumiu que eu não falava espanhol e foi me arrastando pelo aeroporto a procura de informações, trabalhando arduamente como minha intérprete. Eu fiquei caladinha, rindo por dentro e achando linda a boa vontade dela.

Já dentro do ônibus, à noite, comecei a observar a paisagem e me dei conta de que a entrada de Barcelona é idêntica à Linha Vermelha do Rio de Janeiro, o que não é lá algo muito positivo. Sem querer, entreouvi a conversa de umas meninas e notei que elas eram brasileiras. Já fui logo puxando assunto (não sei por que diabos fiquei tão extrovertida na Europa) e fomos conversando até descer do ônibus. Distraída, não percebi que Barcelona estava prestes a se assemelhar ainda mais ao Rio: na bagunça para tirar a mala do ônibus, roubaram minha carteira. Já havia sido alertada sobre os pickpockets de Barcelona, mas não sabia que aconteceria comigo no primeiro segundo em que pisei na cidade. Malditos mãos-leve. Levaram meu dinheiro e meu VISA Travel Money, além de alguns documentos brasileiros. Por sorte, havia separado o cartão de crédito do meu pai e meu passaporte. Para piorar, meu celular não funcionava, porque não sabia o PIN do cartão alemão ainda, e eu não tinha o endereço do hostel. Por alguns minutos, um misto de desespero, vazio, fome e sentimento de burrice se apoderou de mim e eu fiquei completamente sem ação. Pedi uma moeda para um cara para ligar para o Thomas e a ligação não funcionou. Entrei na estação e, enquanto pensava no que fazer, o Thomas apareceu com um sorriso, um abraço forte e uma caixa de chocolates suíços. Alívio. Fomos à polícia e me disseram que era possível que devolvessem os documentos. Deixei meus contatos, mas não tive notícias até hoje.

Chegando ao hostel, um bilhetinho do Luis, que faria o meu check-in. A recepção já havia parado de funcionar e ele deixou a minha chave para que eu não ficasse na rua. Antes de dormir, fomos fazer uma caminhada na madrugada barceloneta para ver como era a vizinhança. Eu já não tinha nada a perder, mesmo! Nos sentamos no Bracafé (sim, um bar brasileiro, mas sem um item brasileiro no cardápio) e o Thomas bebeu um cerveja e comeu uma omelete típica da Espanha. Eu fiquei observando, exausta e incrédula, e pensando em como contaria para os meus pais o tamanho da minha burrice. Depois de escrever um email a eles, fui dormir.

Dia II
Acordei domingo às nove. Bem cedo, para quem foi dormir depois das duas e tinha passado por toda aquela sobrecarga emocional. E, incrivelmente, não me sentia mais tão burra por não ter colocado o dinheiro em bolsos diferentes e me decidi que não valia a pena me deixar afetar por isso. Havia uma cidade imensa me esperando lá fora. Thomas e eu saímos em direção ao Templo Expiatório Sagrada Família, o cartão-postal de Barcelona. A igreja foi projetada pelo Gaudí e está sendo construída desde 1882 e a previsão é de que fique pronta em 2026. Não vou dar detalhes históricos (vocês podem lê-los aqui), porque demoraria tanto quanto a própria construção da igreja. A minha impressão é que ela, tão grandiosa e detalhada, parece uma vela derretida. Não digo isso negativamente, de jeito nenhum. Mas que parece, parece. Não tivemos paciência de esperar na fila quilométrica para entrar no museu, mas seguimos um casal de turistas e fomos parar dentro da igreja, em plena missa. Já que estávamos por lá, assistimos a um pedaço da missa em espanhol e foi bem interessante. É realmente incrível perceber a força que a religião exerce em seus crentes. Olhando em volta, pude perceber senhorinhas impelidas à adoração, aos pés da cruz.

Na rua, em frente à Sagrada Família, uma aglomeração. Bem agarrada à minha bolsa, entrei no meio para saber o que era e me deparei com pessoas vestidas com calças coladas e blusas extravagantes. De repente, elas começavam a subir nos ombros umas das outras e... voilà! Eram os famosos Castelleros. São grupos de pessoas que se apresentam nas ruas formando pirâmides humanas. Bem bacana.


Voltamos correndo para o hostel, porque havia um passeio programado às 13h para o Parc Güell. Chegamos atrasados e as pessoas já tinham saído. O Thomas aproveitou para ir dormir um pouco e eu fiquei na recepção conversando com o Luis. Foi quando duas figuras apareceram diante de mim, me convidando para fazer Acro-Yoga no terraço. Um deles era brasileiro e a outra era espanhola e ambos faziam parte do staff do hostel. Como não estava fazendo nada e estava disposta a aproveitar cada segundo, fui "só para ver" e acabei fazendo acrobacias malucas que nunca me julguei capaz de fazer, ao som de MPB e Beirut. Isso me custou alguma dor muscular no dia seguinte, mas valeu a pena. Conheci pessoas incríveis e me senti muito mais leve.



Depois da Acro-Yoga, fomos almoçar e seguimos para o Parc Güell, também desenhado pelo Gaudí. Andamos bastante e subimos uma escadaria gigante e muito cansativa, porque o parque fica no topo de uma colina. Ao chegar lá em cima, o ódio: havia escada rolante e nós não sabíamos. De qualquer forma, valeu a pena. A vista é maravilhosa e o parque desperta a deliciosa sensação de estar em um mundo fantástico, em uma dimensão paralela. Tudo lá se funde com a natureza. As colunas que sustentam as irregulares construções são tombadas e os mosaicos vibram, coloridos. E lá se apresentam violinistas, saxofonistas, grupos musicais e dançarinos de rua. Eu me apaixonei pelo Gaudí.


Saindo de lá, o fim do dia prometia um crepúsculo bonito e fomos andando até encontrar a praia. Ao chegar ao Port Vell, porém, comecei a me sentir mal e quis ir embora imediatamente. No hostel, dormi um pouco para ver se melhorava e, à noite, já estava nova em folha. Ficamos no terraço conversando - em espanhol, quem diria - até tarde com o Rafa (o brasileiro da Yoga), a Laia e a Sophie, uma menina belga.

Dia III
Depois de esperar muito tempo até o Thomas acordar, fomos à "La Pedrera" ou "Casa Milà", também construída pelo Gaudí, desta vez para uma família da aristocracia barceloneta. Lá pode-se ver o apartamento reconstituído, além de um terraço lindíssimo e surreal, de onde se tem a vista da cidade. O interior e a decoração do apartamento remete um pouco às casas antigas de Ouro Preto, com direito a piso de cerâmica da cozinha da casa da vovó e uma casinha de bonecas que é o sonho de qualquer menina. Saindo da Pedrera, fomos ver a "Casa Batlló", a dita obra-prima do Gaudí. Exatamente por isso, o preço de entrada era absurdo (o dobro do Louvre) e resolvemos que só a fachada já bastava e era suficiente para confirmar o brilhantismo do artista. Já com fome, seguimos à orla, com objetivo de encontrar a champañería mais famosa de Barcelona, a Can Paxano. Ficamos perdidos e, depois de uma longa caminhada na beira do porto e de vislumbrarmos ao longe o "Mirador de Colón" (Colombo, para as pessoas de mente poluída), resolvemos que era inteligente perguntar. A champañería era um cantinho escuro, cheio de carne seca pendurada e estantes infinitas de cava, a champagne produzida em Barcelona. O lugar me lembrou, inclusive, o nosso Mercado Central. Pedi um bocadillo de sardinha e uma taça de cava extra e foi uma delícia, mesmo que a sardinha estivesse muito salgada e cheia de espinhos. Tendo bebido duas taças de cava, saí de lá felizinha e com uma garrafa do produto na mão, porque custava míseros dois euros e era uma delícia.


Chegando ao hostel, conhecemos mais cinco brasileiros, a Ana, o Cilnei, o Rapha (também do staff) o Jefferson e o Tiago, um escocês, o Alan, e um canadense, o Julien. Bebemos juntos a garrafa de cava na cozinha, enquanto o Luis nos ensinava a cozinhar tacos mexicanos. Estava tão bom que nos esquecemos que tínhamos combinado de ir para a boate. Resultado? Fomos assim mesmo, mas às duas da manhã. Chegando lá, a festa já estava um pouco vazia e não ficamos muito tempo mais, mesmo que a música estivesse boa.

Dia IV
Terça-feira a programação ficou toda por minha conta e eu estava louca para conhecer o museu do Miró. Ao olhar nos mapas e pesquisar na internet, vi que ele ficava perto de um castelo cuja existência eu desconhecia. E o interessante era que, para chegar tanto ao castelo quanto ao museu, era necessário pegar um tal "transporte funicular" e um teleférico! Saímos, então, depois do meio-dia, porque o Thomas demorou horas para se arrumar e o Julien ficou fazendo piada sobre isso. Antes de irmos, passamos no Camp Nou para comprarmos ingressos para o jogo do dia seguinte, FC Barcelona x FC Copenhagen. Nem estava acreditando que eu ia mesmo viver isso.

Gente, preciso confessar que morri de medo do teleférico. Parecia que a qualquer hora ele despencaria. Ao chegar lá em cima, o mar parecia ainda mais azul e o céu estava também colorido em um azul intenso. Como a vista era maravilhosa, ignoramos o tal castelo por um momento, subimos em cima de um canhão e ficamos lá, tomando sol e curtindo a paisagem.


Depois, fomos almoçar no restaurante do castelo e ganhamos uma taça de vinho. A culpa não é minha: Barcelona QUER que as pessoas bebam muito. Já de barriga cheia, fomos ver o Castell de Montjuïc. Não é bem um castelo, mas uma fortaleza que data do século 17. Não há muito o que ver, a não ser um pequeno museu sobre a história do lugar, reforçando a importância da "fomenta de la pau". É "pau" para todo lado em Barcelona. Levou um tempo até cair a ficha que "pau" significa "paz", em catalão. PAZ. Saindo do castelo, fomos ao museu do Miró. Finalmente. Foi uma pena termos chegado tão tarde, porque o museu era lindo e fecharia em uma hora. Obviamente, não deu tempo de ver tudo.

À noite, nos sentamos mais uma vez no terraço iluminado por velas, e bebemos sangría. Duas americanas, a Arjana e a Yumeko, um australiano cujo nome nunca soube, o Julien, o Rafa e o Thomas. Mais tarde, fomos todos para a cozinha, bebemos mais um pouco e lá vi uns dinamarqueses, que estavam em Barcelona só para irem ao jogo do dia seguinte. Eu tomei uma canja de galinha pronta para ver se melhorava da gripe, que a essa altura já estava fazendo lacrimejar meus olhos a ponto de eu não enxergar nada.

Dia V
Acordamos todos bem cedo e nos encontramos na cozinha, para tomarmos juntos o café da manhã e seguirmos para o Bairro Gótico. Era meu último dia na cidade e eu queria muito sair para ver tudo o que faltava, o que era impossível. Barcelona é incrivelmente grande e cultural e não dá para conhecer tudo em cinco dias. Pegamos o metrô e descemos no ponto perto de La Rambla, a rua mais famosa da cidade, onde fica uma feirinha de rua e o Grande Teatro do Liceu. O Bairro Gótico, por si só, já é lindo. Fomos à Catedral, à Praça Real, visitamos as colunas romanas remanescentes e vimos ainda algumas outras igrejas, incluindo a de Santa Creu. Foi uma longa caminhada, que acabou na orla da praia Barceloneta. Comemos uma típica paella com direito a um chupito no final. É um licor de ervas digestivo que os espanhóis costumam beber depois de comer. O negócio é forte até dizer chega. Quanto à paella, é uma DELÍCIA, mas muito difícil de comer, por causa da quantidade de conchas e ossinhos no prato.

Para finalizar, fomos caminhar na praia, o que fez a minha dor de cabeça desaparecer em um piscar de olhos. Senti a areia macia, a água gelada e a brisa, admirei as esculturas de areia e me permiti fechar os olhos para respirar o que ainda podia de Barcelona.


Cheguei ao hostel cansada e tive que dormir um pouco antes do jogo do Barça. Fomos para o jogo eu, Thomas, Yumeko, Eduardo, Cilnei e Ana. Nos sentamos em lugares diferentes. Eu e o Thomas ficamos em um assento bem lá no alto, atrás do gol. Nâo era a melhor posição para se assistir ao jogo, porque mal podíamos distinguir os jogadores. Consegui reconhecer o Puyol, por causa do cabelo e o Messi, por causa do movimento. Depois de um tempo, perguntamos para um menininho quem eram os outros jogadores. O jogo em si não foi lá grandes coisas. O Barça ganhou de 2 x 0, mas foi um pouco sem brilho. Para mim, o mais emocionante foi o simples fato de estar no Camp Nou e respirar o mesmo ar que grande parte dos campeões mundiais. E a torcida dinamarquesa era super vibrante e praticamente apagava a torcida numerosa dos espanhóis, que se limitavam a bater palmas.

Voltando para o hostel, pensei nas 3 horas de sono que me cabiam até a hora da partida. Deitei, mas quase não dormi, tamanha era a tensão. Tinha medo de pegar o ônibus noturno às 3 da manhã e ser roubada de novo, então peguei um táxi até a rodovíária. Com o taxista, uma longa conversa em espanhol sobre literatura. Ele me desejou muita sorte e se despediu com um profético "não se preocupe. Você é uma boa pessoa e será recompensada por isso..." na hora que eu desci na rodoviária. E, depois de 16 horas viajando, esperando e trocando de meio de transporte, cheguei na fria Saarbrücken. Fui recebida com uma temperatura de 0ºC e lamentei muito ter ido embora da Espanha.

Bom, chega ao fim o meu relato tão longo sobre dias tão bons. Estou com uma ligeira depressão pós-Barcelona, tentando tomar coragem para enfrentar o frio lá fora e a primeira semana de aula. Não sei como terminar o post, assim como não sei como sair verdadeiramente do espírito de férias. Então acaba assim, como se não tivesse fim mesmo.



terça-feira, 12 de outubro de 2010

Feira do Livro em Frankfurt e roupa lavada.

Acho que posso dizer que hoje foi, oficialmente, o meu primeiro dia das crianças como uma verdadeira adulta. Há alguns anos já não ganho presentes nem comemoro a data (salvo a minha penúltima ida à Brasília, quando brinquei de achar doces no quintal com os priminhos do Pedro), mas hoje precisei cozinhar, lavar louça e roupas. A única parte do dia que realmente simbolizou a infância foi colocar antisséptico nos machucados nos meus dedos, causados pela lavagem de meias à mão. Tinha me esquecido do tanto que ardia cuidar de uns raladinhos à toa. Ah, o bom e velho Merthiolate, salvando-nos das infecções e permitindo-nos inúmeras quedas de bicicleta!

Bom, indo ao fim de semana. Preciso confessar que não aproveitei tanto quanto deveria. A sexta-feira estava ensolarada e eu fiquei o dia todo em casa, sofrendo os efeitos da distância e da saudade. E ainda caí na besteira de assistir "Cartas para Julieta" e chorei do começo ao fim, lamentando a ausência do meu amado e de pessoas que penteiem meu cabelo ou me abracem. Sinceramente, não sei como as pessoas por aqui conseguem viver bem sem um abraço ou um sorriso. Todos os dias, sem desistir, sorrio para o motorista do ônibus ou para a moça do Mensa. Ninguém sorri de volta. Pelo menos um abraço da Michelle eu ganho de vez em quando, depois de ter explicitado o valor de um carinho para um brasileiro. Enfim, conversei um pouco com os meus pais e importunei alguns dos meus amigos com mais uma crise de carência, que dessa vez não estava relacionada à TPM, mas à real ausência de carinho. Não é estereótipo. Europeus SÃO frios. Depois de muito chorar, tomei atitude semelhante à das mulheres que compram sapatos para curar depressão: comprei uma passagem de avião. Para onde? Itália. Vou para Bologna em dezembro visitar o Alexandre. Serão cinco dias na cidade dos pórticos e da terracota, visitando um amigo querido, degustando vinhos e cappuccinos legítimos, deliciando-me com massas, pesto e ares italianos. Aproveitando a proximidade e o preço amigável dos trens, vou visitar Verona, a cidade de Romeu e Julieta e dos muitos monumentos antigos. Como se não bastasse, vou ao show do Kings of Leon em Bologna! Não é muito melhor do que comprar sapatos?

Sábado acordei com olhos inchados e dor de cabeça, sintomas típicos de ressaca de choro. Decidi que não podia ficar assim para sempre e convidei a Michelle para um café no centro. Fomos a quase todos as confeitarias e padarias à procura de tortas como as feitas em Pushing Daisies, porque eu tenho assistido ao seriado freneticamente e fico cada vez mais aguada por uma torta do Pie Hole, que não existe. O mais parecido que encontramos foi uma Apfeltasche, uma massa triangular recheada de maçã e passas. Comi duas, de olhos fechados, fingindo ser uma torta. A vontade não passou, mas a situação ridícula me fez sorrir um pouco. Depois disso, fomos passear nas lojas para ver as roupas em promoção, mas não comprei nenhuma, pensando nas minhas futuras viagens. Voltei para casa um pouco mais animada, mas fui dormir triste, pelo mesmo motivo de sexta. Dormi cedo, pensando que a viagem do dia seguinte, para Frankfurt, me alegraria.

Em pleno domingo, estava de pé às seis da manhã, fazendo café mecanicamente. A temperatura estava por volta de 5ºC, eu não sabia e saí de casa despreparada, com apenas (!) três blusas de frio. Chegando no ponto de encontro dos estudantes que iriam para a excursão (me senti tão no colégio com isso de excursão!), todo mundo estava com casacos imensos, cachecóis e chapéus. Ha-ha. Brasileira-novata-que-não-sabe-se-proteger-do-frio. Passadas algumas horas, porém, todos os meus coleguinhas carregavam seus pesados casacos e eu estava feliz com a ausência do meu. A viagem levou duas horas e, chegando na Buchmesse (Feira do Livro), que era o objetivo da nossa viagem de nerds, todos os sessenta excursionistas se separaram e lá se foram minhas esperanças de fazer novos amigos. Rumei sozinha para o pavilhão de literatura e fiquei embasbacada diante da variedade de livros. A minha parte favorita, todavia, não foi exatamente a de livros de literatura, como pensei que seria. A menina dos meus olhos foi a seção de arte. Muitos cartões postais incrivelmente lindos e criativos, livros imensos de fotografia... Queria ter levado algum para casa, mas fui sensata e me lembrei que as malas de volta para o Brasil têm limite de peso. Então, me restringi a comprar alguns postais e um livro solitário no pavilhão de língua francesa: Chats. É feito para amantes de gatos e é constituído de informações e dicas para quem quer cuidar dos bichinhos. Mas o que realmente me fez comprá-lo foram as fotos e o fato de que é um livro animado: há bolsinhos com outros livretinhos dentro, fotos e partes secretas que se abrem e revelam um mundo inteirinho de gatos. E o melhor: a moça que me atendeu não falava alemão, então realizei a compra toda em francês.




Depois de cinco horas passeando pela feira, comecei a morrer de fome e, ao procurar por comida, percebi que o público era majoritariamente carnívoro e a única opção para mim era... bretzel. Comi um e devorei o pacotinho de lanche que tínhamos recebido do pessoal da faculdade. Fiquei me sentindo meio estranha e minha cabeça doeu quase que imediatamente depois de tomar um iogurte de morango. Lembrei-me, de repente, que o nosso ônibus saía às três rumo à cidade para um passeio guiado. Saí desembestada à procura do estacionamento e fiquei perdida na feira. Por mais que pedisse informação, parecia que estava andando em círculos e a dor de cabeça foi pesando e aumentando. Quase desisti de encontrar o ônibus, que voltaria dali a três horas para buscar quem tivesse optado por ficar na feira. Mas, na última tentativa, encontrei meus colegas excursionistas. Sorridentes, eles fumavam do lado de fora do ônibus, atrasando a partida. Ainda bem.

O passeio guiado me irritou muito. Ficamos dentro do ônibus durante uma hora e meia, enquanto uma mulher não parava de tagarelar coisas como: "à direita, um banco. À esquerda, o maior centro comercial de Frankfurt". Raramente ela comentava sobre os monumentos históricos. Uma hora ela apontou rapidamente para a casa do Goethe e ignorou a estátua de Schiller, que brilhava à nossa frente. Eu mereço. A minha sorte foi que um alemão sentou ao meu lado e foi me explicando sobre as coisas que me interessavam. Saímos do ônibus por apenas vinte minutos, o que significa que tirei pouquíssimas fotos.




Voltando para Saarbrücken, eu só queria saber de banho e cama. O dia havia sido extremamente cansativo. Achei Frankfurt uma cidade bonita, mas dispensaria com tranquilidade a mulher tagarela e teria ficado mais feliz se tivesse comido algo decente durante o dia. Minha cabeça queria explodir e não melhorou quando cheguei em casa e me irritei com coisas bobas. Dormir logo era o melhor que eu podia fazer. Tudo que eu mais queria era voltar para o Brasil, naquela hora mesmo. Levei muita bronca dos meus amigos quando eles descobriram isso. Mas, gente, eu só queria uma sopinha e um cafuné. É pedir demais?

Ontem saí de casa para resolver pendências domésticas e fui surpreendida por um ato de carinho (finalmente!): na minha caixa de correios, um livrinho de receitas vegetarianas em alemão e um bilhetinho fofo. Vinham ambos da Lud, a outra brasileira da UFMG que chegou semana passada aqui. Eram agradecimento pela ajuda oferecida na primeira semana dela aqui. Isso me proporcionou o famoso calorzinho no coração e me fez encarar o dia de um jeito diferente. E hoje? Bom, já contei no começo do post sobre o meu lerê-lerê e só tenho a declarar que morri de medo da máquina de lavar. Pensei que ela fosse levantar voo a qualquer momento, tamanha turbulência ela demonstrava. E agora tenho um varal no meu quarto, cheio de roupas que provavelmente vão demorar a secar. A situação não está muito bonita, mas pelo menos tenho roupas limpas para o meu fim de semana em Barcelona! Já é sábado agora. Ainda parece meio irreal, então não sei que tipo de expectativa criar. Talvez seja melhor assim! Volto depois com novidades catalãs e com fotos do mar.



quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Gymnasium am Rotenbühl e a casa da mãe Joana.

Como já tinha contado para vocês aqui, fui convidada por uma professora de história e inglês que trabalha em um colégio aqui perto para participar de uma feira de conhecimentos. O tema é a América Latina e queriam que eu falasse, para as crianças da sétima série, sobre a infância no Brasil. Mesmo morrendo de medo de ser julgada pelo meu alemão medíocre, já que crianças não hesitam em falar a verdade, aceitei o desafio e pensei que seria uma oportunidade única. Era a minha chance de vivenciar uma situação real de uso da língua que não fosse chata como o banco ou a padaria. Mesmo que a professora tenha falado que eu não precisava preparar nada, que bastava eu aparecer, tentei esboçar algum texto, praticar em frente ao espelho e coletar algumas informações interessantes, para que eu não passasse pelo constrangimento de não ter o que falar. O tema era, porém, amplo demais: infância. Como eu podia ser egoísta a ponto de falar sobre a minha própria infância, enquanto ela certamente não representava a maioria dos brasileiros? Pesquisei um pouco e pensei na melhor forma de falar sobre a miséria, as favelas, as crianças de rua, o tráfico de drogas e o trabalho infantil. Por um lado, temia que isso pudesse impressionar e traumatizar os alemãezinhos. Por outro lado, tinha certeza de que eles deviam saber da verdade. Plano feito, então: começaria falando dos pontos negativos e depois explicaria que eu tinha sorte, que meu destino tinha sido diferente e que eu tinha curtido a minha infância como muitas crianças não podem no nosso país.

Pois bem. Acordei ontem com um friozinho gostoso na barriga. O sol brilhava forte no céu azul e o clima estava super agradável. Vesti a camisa da seleção brasileira que a Taiga me deu e fui para a Universidade encontrar o Jackson e a Anne, a professora. Chegando na escola, uma surpresa. O Gymnasium am Rotenbühl é enorme e imponente. As crianças passeavam livremente, inclusive do lado de fora da escola, sem uniforme. Era a hora do intervalo e elas usufruíam do direito de ir e vir, sem precisarem se preocupar com algum bandido cercando a escola para assaltos ou sequestros-relâmpago. Já estava aí a primeira diferença que eu podia relatar a eles.

Entrando na sala de aula, foi um pequeno sacrifício reunir as crianças em um círculo para darmos início. Criança é criança em qualquer lugar do mundo e eles pareciam uns capetinhas correndo pela sala. Quando a professora finalmente conseguiu acalmar os ânimos dos alunos, eu e Jackson nos apresentamos e eu disse que eles podiam perguntar qualquer coisa. Um menino levantou a mão e disse: "antes de perguntar, eu queria dizer que você fala alemão muito bem" e eu morri do coração. Foi lindo. Depois seguiram-se várias perguntas, desde as mais bobas "você tem animais de estimação?", passando pelas mais sem noção: "é verdade que as crianças atiram nos cachorros no meio da rua?", "você já foi picada por uma cobra?" ou "você já viu alguém ser assassinado?", até as mais interessantes, que envolviam curiosidade sobre a vida das crianças de rua e sobre as últimas eleições presidenciais. Ficamos cerca de uma hora e meia conversando e foi super agradável. Eles me convidaram para voltar no dia seguinte para ver os cartazes prontos e o resto da feira.





Crianças me fazem um bem danado! Senti muitas saudades dos meus alunos. Saí de lá saltitante e de bem com a vida. O dia continuava lindo e ensolarado, e o ar fresco da floresta me acompanhou até em casa. Fiz salada de batata com maionese, pimentões e azeitonas, fritei um filé de peito de frango e esquentei o arroz. Delícia. Depois, dormi a tarde inteira, pensando na beleza da manhã daquele dia. Acordei meio molenga e com preguiça, ignorei o telefone e a campainha algumas vezes. Fiquei pensando que eu era uma pessoa horrível por fazer isso, mas foi melhor assim. À noite saí para beber um vinho e conversar.

Hoje acordei cedo e não quis ir para a aula de produção de texto. Fiquei enrolando na cama, assisti ao primeiro episódio da segunda temporada de Pushing Daisies e fui encontrar com a Ludmilla no Mensa. Ela também estuda na UFMG e chegou aqui semana passada. Ficamos algumas longas horas conversando, o que foi super animador. Depois, voltei para casa, me arrumei e fui de novo ao Gymnasium am Rotenbühl. São só cinco minutos de uma caminhada agradável até lá. A escola estava fervilhando de familiares e amigos dos alunos e me lembrou um pouco das nossas próprias feiras de ciência. Logo na entrada, uma apresentação de dança. Tá, uma gracinha, mas alemães não têm o nosso molejo e as danças foram todas bem automáticas. Tudo foi ficando mais interessante à medida em que eu ia adentrando as salas de aula. Filmes em stop-motion produzidos pelos alunos, campanhas contra a AIDS, fundos de apoio aos índios guaranis, projetos de preservação da Amazônia, moinhos de vento e mini-máquinas movidas à energia solar. Visitei com cuidados os estandes e percebi que as crianças são muito mais engajadas aqui. Todas elas têm algum envolvimento real com o que estudam ou trabalham. Isso é muito admirável.


Depois de visitar quase todas as salas, comprei um café (gente, café alemão é MUITO ruim) e fiquei observando uma apresentação de percussão. Fantástica! O professor tem um ânimo invejável e os meninos tocaram até a música da Shakira da copa do mundo. Eu quis muito rir, mas fiquei só no sorriso mesmo. Coloco aqui um vídeo para vocês verem.


E, por último, anuncio que agora sou a mãe Joana e esta é a minha casa. Abri a janela e, de lá, saíram milhões de joaninhas. Não sei bem o porquê de elas terem escolhido o peitoral da minha janela para se reproduzirem e nem sei o que fazer com elas. Acho que vou esperar que elas voem de volta para a floresta, porque não vou ter coragem de matá-las nem de espantá-las. Elas são tão bonitinhas! Tem de toda cor, com ou sem bolinha, grande e pequena. Dizem que joaninha dá sorte. Eu devia jogar na mega-sena e ver no que dá.

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Alarme de incêndio e Luxemburgo.

Sabe aquele tipo de pergunta como: "o que você levaria para uma ilha deserta?" ou "o que você salvaria em caso de incêndio?". Então. Acabei de ter a oportunidade de colocar em prática uma das reflexões - e não foi a da ilha deserta. Estava no chuveiro, esperando a água esquentar para eu finalmente tomar um banho, quando escutei um barulho estridente vindo do corredor. Era o alarme de incêndio. Rapidamente, vesti uma roupa e mantive a calma, assim como a gente vê nos filmes. Sem pânico, desci as escadas. Ok, talvez correndo um pouquinho, com um medo subconsciente de que pudesse ser verdade. No percurso até o pátio do prédio, pensei se deveria voltar e pegar meu computador, meus livros e minha câmera. Olha que bobagem! Eis que, no meio da escada, chegando no 2º andar, encontro o Ye, meu amigo chinês engraçado. Ele estava super nervoso, misturando inglês e alemão, tentando me explicar que tudo tinha sido culpa dele. Ele estava começando a cozinhar uma aparentemente deliciosa sopa típica chinesa quando a fumaça subiu e disparou o alarme. Não havia incêndio, meu quarto ficaria bem. Mas ele não. Coitado, gente! Ele pediu desculpas pra todo mundo que havia descido para o pátio e ficou super sem graça, sem saber como reagir. Eu o levei até o quarto, abri as janelas para o ar circular e fiquei lá, contando histórias bobas para ele se acalmar e se distrair. Quando ele começou a falar sobre política e tradições chinesas, senti que ele estava bem e eu podia ir embora. E só agora, duas horas depois, consegui tomar meu banho e me sentar para contar sobre o fim de semana, que foi fantástico.

A noite de sexta-feira foi uma confusão. Eu estava empolgada, querendo saber como era o Oktoberfest da minha própria cidade. Já sabia que não seria grandes coisas, mas talvez pudesse finalmente provar o Glühwein. Me arrumei e combinei com o Styben de nos encontrarmos no pátio do prédio para irmos juntos. Ele disse que sabia o caminho. Não preciso nem dizer que pegamos o Bahn na direção contrária e levamos séculos para chegar lá. No caminho, encontramos o Ioan e ele foi com a gente. Graças à informação de uma indiana completamente bêbada, chegamos ao Saarterrasse. o local da festa. No ponto de ônibus mais próximo, prontos para voltar para casa (ou para a boate), estavam todos os nossos amigos, nos quais nós supostamente tínhamos dado o bolo. Entre eles, estava o Ian, que não queria ir para a boate com os outros e voltou para o Oktoberfest com a gente. Fomos nós quatro rumo à festa, que já chegava ao fim. Não tinha Glühwein. Bebi uma taça de vinho tinto. Comi um crepe com chocolate. Pronto! A festa acabou e fomos de lá para um bar belga no centro da cidade. Lá provei a única cerveja realmente gostosa que já bebi e tomei uma sopa de cebola com queijo deliciosa. Apesar dos pesares, foi uma noite muito agradável, com pessoas muito bacanas.

Sábado acordei animada com o convite do Matt e da Michelle: passear pela parte antiga de Saarbrücken. Eu já conhecia, mas não me importava de rever o castelo (que nada tem a ver com os castelos europeus), seu jardim abandonado e a bela vista para o rio. Durante a caminhada, vivenciei o outono. Ar fresco e árvores multicoloridas cujas folhas cobriam as ruas. Acho que é essa a minha estação do ano preferida, apesar de não ter vivido as outras por aqui. Depois de vermos os pontos turísticos e de andarmos bastante, fomos almoçar no "Tomate", um restaurante charmosinho que fica perto do castelo. Comi meu primeiro ratatouille e, também pela primeira vez, créme brûlée. Era meu sonho quebrar a casquinha de caramelo, como faz a Amélie Poulain. Foi lindo e eu senti calorzinho no coração. Andando de volta para a Johanneskirche, saltitei (daquele jeito que vocês sabem) muito, sorri de orelha a orelha e cantei. Na igreja, ouvimos um recital de órgão de peças do Bach e eu me lembrei da Lu e do Paulo Mattos. Sem parar. Por eles, fechei os olhos e absorvi a música que ecoava.

Mal dormi da noite de sábado para domingo, tamanha excitação e ansiedade para que o dia amanhecesse logo. Era dia de finalmente conhecer a capital do país mais próximo a Saarbrücken: Luxemburgo. De lá, só sabia que era o único grão-ducado ainda existente, um dos menores países da europa e o mais rico do mundo. Esses três fatores eram suficientes para fazê-lo único. Segui para a estação de trem para encontrar o Ian e estava mais de meia hora adiantada. Enquanto esperava, observei uma estranha movimentação. Por alguns instantes, havia me esquecido que era o feriado nacional da Alemanha: o dia da reunificação. Em comemoração, as passagens para qualquer lugar da Alemanha custavam apenas 20 euros. Berlim logo me veio à mente, mas era longe demais para ir e voltar em um dia. Não valia a pena (ou assim pensei no momento. Agora descobri que eu podia ter comprado a passagem domingo e usado até o fim do mês. Maldito seja o mal-entendido linguístico). Compramos, então, a passagem de ônibus para o grão-ducado e, em uma hora e quinze minutos, estávamos lá.

Eu estava morrendo de fome e talvez por isso a primeira impressão do lugar não tenha sido tão boa. A estação de trem era suja, cheia de bêbados pedintes. Não exatamente o que eu esperava de um país tão rico. Depois de rodar a cidade toda meio cega, procurando algo para comer e ignorando a vida além do meu umbigo, achei um Subway e foi ali mesmo que eu fiquei. O Ian e eu não conseguíamos entender uma palavra do alemão do atendente, mas no final das contas eu comi exatamente o que tinha em mente, então a comunicação foi eficaz. O engraçado por lá é que eles têm três línguas oficiais: alemão, francês e luxemburguês. As inscrições nos prédios são, em sua maioria, em luxemburguês e os cardápios e placas em francês, mas as pessoas falam mais frequentemente alemão. Vocês podem imaginar a confusão mental que é isso, né? Quando eu estava com a cabeça preparada para pedir meu almoço em francês, vem o atendente com aquele alemão esquisito. Tudo, porém, melhorou depois de comer. Consegui enxergar a cidade ao meu redor. Era de enlouquecer qualquer um. O sol brilhava, o céu estava absurdamente azul e o clima ameno. Tento escrever minhas impressões a respeito, apesar da certeza da falha.

Luxemburgo é pequena e se divide entre a chamada "cidade alta" e "cidade baixa". A primeira fica sobre as colinas que circundam a segunda e é o pólo industrial e comercial. Lá são visíveis prédios enormes e luxuosos, com fachadas de vidro que refletiam os brilhantes raios de sol. O que me interessou mais, porém, estava mais embaixo. A "cidade baixa" fica, literalmente, em um buraco. Cravada na montanha que envolve a cidade histórica, está a fortaleza antiga. Ela foi construída pelos romanos e, aos poucos, fortalecida e elevada pelos diversos povos que lá habitaram. Atualmente, a muralha contorna tudo e empresta à "cidade baixa" uma deliciosa atmosfera medieval. Quando me debrucei sobre uma ponte altíssima sobre o Rio Mosel, pude ver um mar de telhadinhos pretos que compunham o vilarejo. Pareciam casinhas de boneca. Em uma parte do vale, pode-se ver a floresta e o parque. Quis descer para ver de perto. Mais uma vez, o outono. As árvores ainda estavam, em sua maioria, verdes, mas o chão já estava coberto de folhas coloridas. Algumas crianças brincavam na beira do riachinho, enquanto outras andavam de bicicleta. O ar do parque era fresco e eu senti todas as preocupações se esvairem. Experimentei uma momentânea paz de espírito que não pensava existir. Fechei os olhos pela segunda vez no fim de semana para ouvir os sons do ambiente, conforme me recomendou o magrelo. Ainda na "cidade baixa", visitamos um mercadinho de arte na praça, onde um velhinho sorridente tocava o realejo. Quatro horas de muita caminhada depois, já exaustos, voltamos para a estação e pegamos o ônibus de volta para casa. Passei na padaria da estação, comprei uma trança folhada de mel e amêndoas e pensei que a felicidade se encontrava naquele pão, depois de viver um dia tão lindo.

Hoje? Acordei com o humor ótimo e a culpa é toda de Luxemburgo. As pessoas de lá têm muita sorte. Enquanto o Brasil sofria (e como sofria!) o processo eleitoral, eu estava em um país onde as coisas funcionam e tudo é bonito. Apesar da saudade dos meus amores brasileiros, que é tão intensa a ponto de me roubar o ar, a vontade foi de ficar ali pra sempre, ensinando português para os alunos da comunidade portuguesa. Ouvindo o realejo e o sussurro das árvores. Para sempre, se eu tivesse comigo o meu amor.











sexta-feira, 1 de outubro de 2010

A incansável busca pela fuga à rotina.

Não é que eu tenha tantos afazeres e aventuras loucas a ponto de não ter mais tempo para sentar e escrever aqui. Na verdade, a Alemanha tem sido muito suave comigo no que tange a estar ocupada. Acordo todos os dias às sete da manhã, tomo um café enquanto leio uma revista, pego o ônibus e vou para a aula. Os horários do curso de alemão são meio malucos e chego a ter cinco horas seguidas de aula, entrecortadas por pequenas pausas de dez minutos para mais um café. Basicamente, as obrigações do meu dia acabam aí. Depois do almoço no Mensa com alguns amigos, volto para casa e já tenho tempo para o ócio, para a escrita, para deveres de casa e para cuidar do apartamento. E é exatamente por isso que não tenho escrito. Parece que já atingi o período do intercâmbio em que tudo se estabilizou e virou rotina e, quando penso em vir aqui contar algo a vocês, não consigo encontrar palavras que façam meus dias mais emocionantes do que realmente são. De qualquer maneira, a intenção do blog sempre foi registrar. Só porque os dias sejam chatos, não significa que os relatos também tenham que ser. Vamos ver se eu consigo essa proeza.

Já não me lembro muito bem da semana passada. Só consigo lembrar da maré de azar e da dor de cabeça que ela me causou. Para tentar me livrar da primeira o mais rápido possível, tratei logo de comprar um cartão de ônibus semanal e pagar a multa que devia. Para resolver a segunda, evitei os remédios e abri uma garrafa de vinho para relaxar. Digamos que acabei abrindo foi uma garrafa de melancolia e não quis sair durante grande parte do fim de semana. Chovia fininho, minha cama estava quente, eu tinha filmes e comida, além de alguns amigos online no Skype. Minha sexta-feira se resumiu a isso. Aproveitei a noite para soltar o riso devido a duas taças de vinho e algumas conversas virtuais, graças ao advento da webcam. E nem venham me condenar. Não é só porque eu estou em outro país que tenho que ser outra pessoa e arranjar algo de super interessante para ocupar cada segundo da minha estadia. É humanamente impossível. Eu concordo, porém, que não devia deixar essa preguiça social se alastrar e tomar todo o fim de semana.

Por isso acordei sábado com o humor um pouco melhor e convidei a Michelle para almoçar na cidade. É incrível como tudo fica diferente no centro nesse dia da semana. Os lojistas colocam as roupas em araras do lado de fora dos estabelecimentos, as pessoas levam os animais para passear e uma feirinha de fazendeiros é rapidamente instalada no St. Johanner Markt. E tudo isso enquanto chove fininho. É muito ânimo, não? Pois bem. Michelle e eu nos sentamos no Alex's, um restaurante charmoso e... repleto de pombos. O garçom precisa dividir sua atenção entre eles e os clientes. Um pombo chegou, inclusive, a voar contra a cabeça de uma moça que estava sentada perto da janela. Eu fiquei sem ar de tanto rir. Coitada. Bom, comi chicken masala, um prato indiano bem apimentado, e tomei um suco de laranja fresco cujo preço era absurdo. Depois de comermos, fomos ver o que significava a pequena aglomeração em frente ao teatro. Era uma feirinha internacional, com pequenos stands com comida típica da Turquia, da Grécia e de alguns países da África. Pena que tinha acabado de almoçar. De qualquer forma, ficamos por lá um pouquinho, porque algumas crianças fofas se preparavam para dançar no palco. Balé, dança moderna com o tema da Pantera Cor-de-rosa e a dança da galinha. A última foi um momento nostálgico, que me levou de volta ao segundo período, quando me vesti toda de galinha para isso. A isso seguiu-se a valsa, executada por dois casais de pré-adolescentes tímidos e preocupados demais com a coreografia para conseguirem sorrir. Depois da apresentação das crianças alemãs, veio uma turca. A menina estava vestida de adulta, com direito a batom vermelho e pintinha sexy no rosto. Ao final da dança, ela distribuiu rosas e eu ganhei uma especialmente bonita - quanto ao perfume nada posso dizer, porque estava gripada. Em seguida, um casal do Uzbequistão tocou música típica. Voz e acordeão. Lindo. Por fim, um grupo de senhoras italianas dançou a tarantella e fechou a tarde com um humor super vibrante. Aproveitando-me da energia recém-adquirida, fui ao supermercado para ter o que comer em casa durante a semana seguinte. À noite fomos para o apartamento do Luke ver Sexdrive e alguns vídeos bobos no youtube. Não quis sair, mais uma vez. Voltei para casa às dez e fui dormir.


Domingo acordei tarde, tomei um café da manhã preguiçoso e demorado e já acabei pensando no que ia fazer pro almoço. Sim, só comer e dormir. Esse foi o meu domingo. E, à noite, mais uma taça de vinho. Mergulhei em um estado de literatice aguda, li Clarice Lispector e Borges, conversei sobre literatura com o Vavá e dormi um sono profundo e merecido.

No dia seguinte, acordei bem disposta, mantendo em mente a previsão do Caíque de que a maré de azar passaria. Fui à aula, participei e tive explicações esclarecedoras sobre a complicada voz passiva alemã. Voltei para casa com vontade de enfiar a cara dos livros e aprender tudo de uma vez. Lógico que falhei e tive mais um dia academicamente improdutivo.

Terça foi um dia estranho. Tive uma noite toda de pesadelos e acordei com um frio na barriga, que se devia à aula de comunicação oral. O professor havia dividido a turma em dois grupos para que pudesse analisar cuidadosamente a habilidade de fala de cada um. Não sou muito fã de ter a atenção voltada para mim enquanto, como aluna, discurso em outra língua. A tarefa? Improvisar em dois minutos de fala uma apresentação sobre o Brasil. Lá fui eu, em pé, à mercê de ouvidos prontos para criticar. Não fiquei satisfeita com meu desempenho, mas o professor elogiou e disse que eu sou articulada, sei lidar com o público e que minha entonação se aproxima à de um falante nativo. Foi um santo remédio para o ego. Voltei para casa toda tagarela e orgulhosa. O orgulho se elevou a um nível ainda mais inesperado quando recebi, por email, um convite de uma professora do colégio aqui perto. Eles estão organizando uma semana de projetos sobre a América Latina e eu fui convidada para falar sobre a infância no Brasil para os meninos da sétima série! Morrendo de medo de ser vaiada, aceitei. Vai ser um belo desafio. Claro que a minha euforia não durou muito. Assisti a Lost in Translation e fiquei novamente com o humor balançado. Mais tarde vieram muitas lágrimas inexplicáveis, que acabaram por tomar o lugar dos meus planos para a noite. Queria ir ao Heimbar provar a Desperados, uma cerveja com sabor de tequila muito popular por aqui. Acabei fazendo sopa de números (porque os alemães são das ciências exatas e não gostam de sopa de letrinhas) e me acabando em desabafos com a Tai. Discursei longamente sobre como eu pensava que não merecia estar aqui, porque não faço nada de útil o dia inteiro. Depois de aliviado o drama, o Ivan me pediu ajuda no dever de alemão e eu consegui explicar tudo direitinho. Tomada pelo sentimento de finalmente ter feito algo de útil, fui dormir.

Dia seguinte, dia de folga. Não tenho aula quarta-feira. Arrumei o apartamento e fiz arroz, acompanhado de batata gratinada na manteiga e na cebola com pimentões. Amarelo, verde e vermelho, para enfeitar o prato e colorir meu dia chuvoso. Subi na escrivaninha para limpar as janelas e vi a floresta de um ponto de vista diferente, além de encontrar uma joaninha pousada no teto. Aqui na Alemanha elas são sinal de sorte. À tarde a chuva deu uma trégua e fui passear. Bastam cinco minutos de caminhada até o Wildpark, uma espécie de zoológico no meio da floresta. Respirei ar puro, caminhei na mata, tomei um solzinho para tirar o mofo, vi javalis, bisões, cabras e alguns outros animais. O ambiente é super agradável e repleto de crianças loirinhas e rosadas. Ao final de uma das trilhas, existe um café. Fui sem dinheiro, então não pude saborear uma torta maravilhosa que estava na vitrine. Daqui a uns dias volto lá para isso.





Ontem à noite fiquei sem internet, não sei por que, e confirmei a hipótese de que é a internet a culpada por eu não conseguir estudar. Sem ela, escrevi um texto em alemão, estudei gramática e li os dois primeiros capítulos do livro que havia comprado em um sebo de manhã. Die unerträglich Leichtigkeit des Seins. A insustentável leveza do ser, um dos meus livros preferidos. Como já conheço a história, achei que seria um desafio legal lê-lo em alemão.

O dia hoje foi tranquilo e... bem, meu penúltimo dia de aula antes das férias. Sim, as aulas começaram há duas semanas e já vou ter FÉRIAS de quase 20 dias. E as aulas na universidade ainda não começaram, para quem ainda não sabe. Só dia 18 de Outubro, quando ainda estarei em Barcelona. É, parece que os próximos dias prometem ser melhores! Hoje vou ao Oktoberfest aqui de Saarbrücken, mesmo achando que é uma farsa, porque o Google não sabe nada a respeito. Depois de hoje, afinal, saberei mais que o Google. Incrível, não?